Buscando não se sabe bem o quê.

terça-feira, 29 de maio de 2007

O Estóico




Aprendi a ler, a escrever e a me comunicar. Aprendi, também, a datilografar em máquinas mecânicas e elétricas. Participei até de campeonatos. E um dia o computador chegou na mesa do meu trabalho. O datilógrafo passou a digitar. Era fascinante teclar e ver as letrinhas verdes na tela negra do vídeo. Digitava petições, escrevia cartas, poesias e bobagens do cotidiano. Outro belo dia a internet chegou e passei a escrever e-mails e me comunicar com outras pessoas em tempo real, via chat. Imaginei personagens, criei fantasmas, vendi ilusões e desilusões, fabriquei mitos, manipulei corações. Meus dedos digitavam rapidamente mensagens à toa e enfrentava a alma e a razão de outras pessoas. Eu era mais rápido do que todas. O pensamento saia direto dos meus dedos. Os dedos dominaram minha vontade, controlaram meu cérebro, se rebelaram do resto do meu corpo e perdi o controle da vida.


Compreendi, então, que da (falsa) solidão do meu habitat poderia conectar outras solidões e que tudo aquilo fazia parte do mesmo universo solitário. A natureza inventada que convive em harmonia anônima na busca de questionável liberdade e felicidade. Confundia razão com carência e solidão com felicidade. Esquecia a dor alheia e a minha própria dor. Confuso dormia tarde quando todos já estavam dormindo. Atrapalhado menosprezei a razão. Eu era o homem sábio que detinha o controle da harmonia da vida.


Finalmente esse mundo caiu. A alma perdeu a anônima identidade. Esse logos foi descoberto. O divino ficou cego. Aquele kósmos perdeu a harmonia. A natureza maquiada perdeu o encanto. Minhas lentes de contato desbotaram. A sabedoria despencou. O discurso esvaziou. Quebrei aqueles dedos.


Meu corpo está sendo embalsamado pela leveza da purificação da alma. Meu purgatório. Fiz transplantes, troquei as lentes, passei a tratar da razão. Fortaleço a felicidade. Esqueço minha impassividade. Não sou mais o sujeito imperturbável, insensível, anônimo. Encontrei o kósmos.

domingo, 27 de maio de 2007

Mônaco


Passeio com meu cachorro enquanto o vigia assiste o grande prêmio de Mônaco. O volume da tv é elevado e se estende pelos cantos gélidos da rua. Agasalho como posso e fico sabendo que Massa virou em 16. Olho para a face do homem que me diz bom dia. Faço questão de responder.

Tento ser politicamente correto na vida exterior, mas fracasso diante de algumas atitudes pessoais. A criança mimada que gosta de brincar de esconder e que -- agora -- optou por viver às claras. Os confortáveis labirintos do anonimato que buscam a falsa felicidade imediata podem parecer interessantes na hora da carência, mas são caminhos cruéis que revelam desilusão, angústia e hipocrisia.

Rejeito o rancor do ex fumante que se tornou radicalmente contra o fumo. Mas se um maço de Carlton foi consumido em minha casa - não quero ser o culpado pelas tragadas que não fiz. Quando se é pai o tempo passa mais rápido e prefiro me ocupar jogando botão com meu filho. Essa linda lembrança íntima é que vai embalar a cadeira de balanço da minha velhice. Depois vou me questionar por ter sido tão tolo.

Volto para casa e dou ração para o cão que olha e não me rosna. Todos continuam dormindo no embalo do domingo. O lar está tranquilo e isso é bom. Subo e vejo Massa virar em 17, mas meu compromisso é com a Santa Endorfina.

quinta-feira, 24 de maio de 2007

O Dia Que Vai Ser Amanhã


O frio impediu meu encontro com Santa Endorfina. Deu preguiça e vontade de tomar sopa bem quente. A corrida da solidão no escuro do parque com trilha sonora lounge deu espaço a uma ceia familiar. O tênis ficou no armário e o chinelo de Gramado ocupou o espaço de meus pés -- quase mancos. Amanhã é outro dia e o astral pode ser outro. Foi bom ter ido ao analista que me analisou e consegui pescar dentro de mim algumas mensagens que estavam escondidas e que podem ser úteis. Amanhã é outro dia e espero acordar com o coração em paz. Prometi um encontro com Santa Endorfina.

Santa Endorfina


dEUS cEGO está ficando feio, velho e bolorento e precisa correr mais do que nunca para recuperar a forma perdida. dEUS cEGO tem de cuidar do corpo, da mente e da alma. dEUS cEGO precisa -- urgentemente -- aprofundar a musculação, tratar dos bíceps, dos tríceps e da panturrilha. dEUS cEGO não pode ficar manco e tem de cuidar -- e muiiiiito -- do que diz. É terrível acordar de manhã e ouvir sussurros de que dEUS cEGO está fora de forma. O pesadelo matinal se espraia pelo dia inteiro e o assunto não sai da cabeça. dEUS cEGO vai correr 7 voltas ao redor do parque, vai jogar 2 sets seguido e depois fazer uma sessão incrível de exercícios abdominais. Quando dEUS cEGO se entupir de tanta endorfina vai voltar a esse mesmo endereço com outro astral.

terça-feira, 22 de maio de 2007

Para Desopilar


O dia leve nasceu nublado e o chuveiro um pouco frio para essa época do ano. Custei para tirar o carro da garagem e resolvi ouvir música no trajeto. As questões políticas -- que antes sempre me fascinaram -- têm gerado sonolência. O samba bossa-nova toma conta da minha mente que reflete sobre os dias no Rio. Longe das balas perdidas pego a faixa do meio com as portas fechadas e o vidro levantado. Na ponte da azenha os viciados morrem de fome e pedem moeda que não dou. Nunca dou. O prédio do escritório, todo envidraçado, me olha com cara de segunda. Bom dia para o porteiro, para o zelador, para a servente. O elevador carregado de pessoas custa a chegar. Bom dia para as secretárias, os estagiários, os advogados. Mesa carregada de provas e documentos, escravo dos prazos me debruço sobre o computador. Antes, porém, para desopilar, uma rápida mensagem.

segunda-feira, 21 de maio de 2007

Poeminha Duvidoso


As interpretações do inconsciente são sempre perigosas, sobretudo em momento de crise. Administrar palavras numa hora dessas nos coloca em situação de risco. O significado do texto pode ser entendido de diversas formas e o feitiço pode virar contra o bruxo. Até mesmo as linhas inconsistentes com realce à forma geométrica, pueril no conteúdo, simples na formatação, podem fazer o céu cair sobre nossas cabeças. E a crise da tempestade de nuvens negras é gerada por poeminha de gosto muito duvidoso. Balbuciamos palavras na noite quando o cérebro está febril e esboçamos poesia no sábado de manhã quando o coração está tranquilo. Condicionamos às interpretações ao contexto dos fatos. Tudo está limitado a aquilo. O poeta refém da singularidade do delito que causou o preciso acontecimento.

sábado, 19 de maio de 2007

Decrescente


Dedo sujo de mate amargo e erva daninha
O samba toca forte na manhã de sábado.
É onde passeio linda flor jasmin.
Ninguém posa sem disfarce.
Fotografias arrumadas.
Formata a forma.
Disfarça o medo.
No contexto.
Do texto.
Da foto.

sexta-feira, 18 de maio de 2007

O Jogo da Palavra Errada


dEUS cEGO cometeu a heresia
ao afirmar numa noite tardia
que o universo masculino
é diferente do feminino
e a gente não ama o tempo inteiro

O assunto passou pelo quarto
e foi dormir na sala
e ao acordar, de manhã cedo,
dEUS cEGO sentiu que pisava em ovos
e foi correndo - devagarinho
escrever sobre as juras do amor eterno

Escreveu mais, bem mais do que deveria
Publicou a primeira mensagem
e depois a segunda e a terceira.
Foram várias mensagens no mesmo dia

dEUS cEGO pode ter se enrolado nos pântanos da aflição
na ânsia incontida de resolver a situação
Sonolento balbuciou
a palavra errada na hora errada
a frase dita como papel de carta antiga
O cristal que trinca colocado fora

O ponto de vista equivocado
gerou o desconforto
Se dEUS cEGO ama
Ele ama e sempre amou o tempo inteiro
Não se joga com o amor
porque não se brinca com a dor

Juras de Amor Eterno


Discuto na cama o tempo do amor, o amor incondicional, o amor eterno, o amor finito e o amor infinito. O tempo do amor pode ser eterno (enquanto dure!), mas pode acabar em desilusão. O amor também pode ser uma nuvem pintada de branco que navega tranquila simulando tempestades. O tempo do amor infinito não morre com a morte. O sufoco e a beleza de amar sempre, todo momento, cada segundo, a vida inteira é o suspiro de amor que encanta a alma e a angústia do nosso poeta. O tempo do amor é extenso que não pode ser esquecido num segundo qualquer. O tempo do amor eterno é difícil de ser sincronizado. Não existe termômetro para medir a febre do amor. A vida é complexa, o coração angustiado e ansioso falha, os carentes pecam, se (auto) enganam. Quando se descobre uma caixinha de segredos o exagero pode tomar conta das interpretações. A neblina das fantasias revela a face oculta do jeito de amar. Desvirtua o amor e seu significado. A incerteza das obscuras confusões. O amor pode penetrar nos labirintos e vencer a crise, a vida e a morte. Só o amor tem condições de dar a volta por cima e superar os desafios. A (re) conquista de um amor desiludido, de um amor perdido, demanda tempo, vontade e paciência. Requer cumplicidade, sintonia, compartilhamento de afinidades, angústias e alegrias. Cientes de que o amor nos exige condições buscamos juras de amor eterno.

quinta-feira, 17 de maio de 2007

Resumo da Ópera


Finalmente ele encontrou o que queria. Casa fácil, mulher boa e bonita e refeição gostosa. Nada podia ser melhor, mas ele queria mais. Vontade vazia de alimentar a carência. Escravo da gula, dos paraísos artificiais e da luxúria. Um quarto de felicidade e pronto. A falsa fantasia toma conta do cérebro algemado pela vontade vazia da falsa felicidade. E o ciclo se completa numa vontade louca que ele não consegue medir a consequência. O desafio de não ser visto, brincando de esconder, até que um dia a zebra veio disfarçada numa lição de casa e a família foi consultar os arquivos do papai. E ele teve de sair de casa, dormir no flat e se transformar em dEUS cEGO.

quarta-feira, 16 de maio de 2007

O Pintor de Nuvens Brancas


Em tempos de virtudes chega o pesadelo que quebra a emoção da coisa boa. A preocupação toma conta do lar e o ambiente fica carregado de angústia . Não adianta pintar de branco a nuvem negra que carrega a tempestade e faz chover nas calhas entupidas. Os pingos molham o guarda roupa mofando as roupas de festa, as esportivas e o moleton. Nossa fúria desencanta a febre que lava a alma. A ternura é esquecida dando lugar a animosidade. A festa acabou e o pesadelo passou. O temporal se dissipou e estamos aguardando a primavera chegar para levar os guris à escola. O carro novo que vai buscá-los. Outra cor, outra marca, outro modelo. O necessário espaço para a compra no super e as malas para viagem à serra. A salutar rotina que amassa as tempestades. O acaso pode condicionar o pesadelo. O controle da tempestade. O pintor de nuvens brancas.

terça-feira, 15 de maio de 2007

Atores e Agendas


Paz na terra aos atos de vontade. Tranquilidade dos dias tranquilos. Gentileza das pessoas gentis. Harmonia na dose certa. Equilíbrio perfeito e exato. Acima e além do bem e do mal. Falsos Moralismos. A maldade da cueca suja e rasgada. Infidelidades banais desnecessárias. Tudo definido pela santa concórdia. Convergência necessária do pacto que sacramenta as atitudes. Crises das emoções. Hipocrisias reveladoras. Basta de sandices e cretinices. Passatempo das palavras. Tudo às claras. Sem nuvem, névoas e neblinas.

E quando chega a noite reflito no lar qual a pauta do dia seguinte.

segunda-feira, 14 de maio de 2007

Tolices


dEUS cEGO nunca aprendeu russo e nunca tomou chá em samovar. Com poder inquisidor dEUS cEGO está a jurar de morte todo aquele que contribuir -- de uma forma ou outra -- para sua infelicidade. dEUS cEGO é como Zeus, fica brabo por qualquer tolice e atira raios que saem da ponta dos dedos. Como as teias do homem aranha os raios buscam firmes a traição da palavra escondida. dEUS cEGO não tem espelho, apesar de ser narciso. Ele sempre se imagina como não é. Apesar de ser cEGO, dEUS tem uma visão espetacular, pois é onipresente e tem o carisma, o dom da onisciência. dEUS cEGO anda cansado porque pouco dorme e quando acorda do pesadelo toma decisões incríveis e monumentais. Tudo é muito monumental para dEUS cEGO que não é santo, apesar de ser candidato à canonização. dEUS cEGO se irrita com os pesadelos, porque não pode fazer nada com o inconsciente. No próximo natal, dEUS cEGO vai pedir ao menino da árvore que lhe traga o milagre da descoberta da inconsciência. Assim, dEUS cEGO poderá dormir em paz e acordar em paz, sem se preocupar com as tolices humanas.

Santo dEUS cEGO



O tempo é curto e os papéis acumulam. Tudo acumula, inclusive as crises. Em tempos de santidades procuro meus milagres. Rezo para Santo Antônio de Sant´ana Galvão. Inês é morta. dEUS cEGO perde a fé na busca de sua própria canonização. As portas estão abertas ao processo. Discuto na cama. Discuto na mesa. Onde estão os milagres da fé? Abortei imediatamente diante da reza do Santo Padre. Coisa mais chata, mais medieva. dEUS cEGO prefere ver multidões embasbacadas com corridas de aviõezinhos na bahia de Guanabara. O milagre da somatização. O milagre da conquista e da reconquista. As portas estão abertas ao processo de canonização de dEUS cEGO. Quero ser santo! Porque santo é o senhor dEUS do Universo.

quinta-feira, 10 de maio de 2007

A sopa na cama. A sopa na mesa





Passei no super antes de vir para cá. Comprei repolhos, couve e resto de aves. Quando o frio chega a sopa deve ser boa. A receita é fazer o melhor possível. O melhor possível, o melhor possível. Tudo em paz no santo coração. O alívio de se dizer a verdade. O alívio da crise superada. Superada? Não se pode apagar o que aconteceu. Aconteceu - aconteceu. Errei, errei e errei. A sopa está pronta no fogão. A sopa na cama. A sopa na mesa. A trombose que sorrateiramente chega e passa por cima da crise. Atinge a perna, a coxa e a virilha. Imobiliza. Apaga a crise? Deleta tudo? Coincidências? Somatizações. O Amante de Marguerite Duras. Ontem ela estava presa na poltrona do cinema. Hoje ela manca deitada tomando sopa na cama. Eu rouco sentado tomando sopa na mesa. Ela fala eu admito. Eu falo ela chora. O Amante de Marguerite Duras. A história infiel. O resto da sopa. O osso da ave que fica no prato. O beijo na testa quente e fria. A pequena injeção. A picada como se fosse minha carne. Olhos tortos que suplicam o amor que nunca perdemos.

segunda-feira, 7 de maio de 2007

Tempos de Castigo




Paguei o flat com cartão de crédito. Foi uma grana do castigo. Déficit dos tempos de castigo. Não conferi a conta, nem quantas águas bebi. Não discuti a conta do estacionamento e do café da manhã com laranjada. São tempos de castigo. Pena se cumpre e não se discute. O calendário do carro tinha retornado ao ano 2000. O clichê do tempo que nunca pode voltar. Minha volta ao futuro, meu passado imperfeito? Que lado "b" é esse? Onde estava? O que fazia? O crime que cometi e a pena cumprida num quarto de flat. Saudade do meu lado "a". Não existe lado nos tempos de castigo. Não existe tempo nos tempos de castigo. O castigo do tempo presente. Sem lado, sem tempo, sem dinheiro e sem custo benefício. A plenitude da essência num quarto de flat.

Flat




dEUS cEGO está procurando respostas
está cansado de manipular
que os homens tomem suas iniciativas
crime e castigo

dEUS cEGO assistiu Nina
A inquilina que assassina a senhoria
é a mesma raiva de sempre
o crime se repete

dEUS cEGO está crente
que as pessoas mudam
o próprio dEUS cEGO pode mudar
Mas para mudar é necessário
reconhecer - e assumir - seus próprios erros

dEUS cEGO nunca leu Lya Luft
Nunca leu auto-ajuda
Nunca leu religião
dEUS cEGO sempre foi agnóstico
mesmo quando rezava o pai nosso

dEUS cEGO dormiu no Flat
são tempos de castigo
os móveis são sempre os mesmos
os quadros também

De fato, o crime não recompensa.

Eu vi


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