Buscando não se sabe bem o quê.

quarta-feira, 27 de outubro de 2010

Casa no Litoral

Perdeu a vontade de ser curioso. Olha pela  manzarda esticando o pescoço que doi. Passa a mão  seca e áspera onde sente a dor. Não é nada. Nunca é nada. O  mar hoje está mais revolto do que ontem. Já é tardinha. A imensidão do vazio toma conta do vento que sopra forte em direção ao norte. A água cospe. O vento chia. Não existe aconchego no frio daquele lugar.  A sopa quente de pacote é preparada no velho fogão  duas bocas. Depois, caminha de chinelo curto e chambre longo  até a varanda. Carrega consigo, também,  o pijama rasgado que sobrou do armário da cidade. No apartamento da rua  das Alamedas, no bairro nobre da capital. .São poucos os passos, mas novamente se  encachaçou e por isso se equilibra como pode. Chega onde pensava chegar. Mas se esquece. Por que, afinal, estava ali?   No jogo da memória aparece a velhice, mas não se trata disso. Ainda está na meia idade. Já fez história no serviço público estadual  e um dia foi chamado de assessor especial do Procurador-Geral. Agendava com ele as reuniões com os sucessivos  governadores, administrava os relatórios, corrigia a concordância e os erros de português.  Foi antes de perder tudo. Quando o partido de oposição conseguiu vencer a eleição por apenas dois pontos.  Depois de anos foi exonerado sem direito a aposentadoria ou pensão. Sobrevive numa casa sem espelho e  sem notícia de jornal.

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